quinta-feira, 14 de agosto de 2008

Intelectuais Negros no Sul do Brasil:
apontamentos iniciais do contato entre
Dario de Bittencourt e Ildefonso Juvenal



Artigo:
Por,


Fábio Garcia (historiador e escritor) Florianópolis, SC






Priscila Bittencourte (acadêmica de jornalismo) Porto Alegre, RS


Em tempos de debates públicos acerca de ações afirmativas, voltadas à população negra, é fecundo o estudo do passado como forma de compreensão dos fenômenos e fatos presentes. É comum lermos de autores especializados nessa cultura a afirmação de que a população negra ficou de fora dos processos de acumulação de capitais após a lei Áurea. Esta forma de ver o passado tornou-se ao longo dos anos um mito para quem estuda o desenvolvimento social no início da República.



No entanto, estudos mais recentes questionam esta visão da história. Elio Gaspari (Jornal A Notícia, 2006) denunciou o sumiço das educadoras negras no quadro de fotografia da Secretaria de Educação do Rio de Janeiro, da década de 20. Baseando-se no estudo “Diploma de Brancura”, de Jerry Dávila, Gaspari, ao frisar o sumiço acena também para seu inverso, ou seja, a presença das mulheres negras desse setor produtivo da sociedade. Não se deveria estranhar tal presença, tendo em vista que a maioria da população negra no Brasil era composta de homens e mulheres negras. O fato curioso é que a historiografia ao longo do século XX, fez questão de omitir este fato, causando no imaginário social a crença de que a população negra ficou em pior situação social com o fim da escravidão. O que não nós parece ser verdade diante das evidências históricas encontradas.



É neste contexto que surgem duas figuras de extrema importância para a história do sul do Brasil, principalmente para os primeiros anos do século XX. São eles Dario de Bittencourt (RS) e Ildefonso Juvenal (SC). Suas trajetórias de vida auxiliam-nos na compreensão das estratégias de mobilidade social elaboradas pela população negra ao longo do processo de abolição, que vai de 1834 a 1888. Se um olhar panorâmico da sociedade brasileira nos oferece uma paisagem branca, pouco bronzeada pelos ventos da África, um olhar mais próximo pode nos trazer surpresas quando há percepção anterior.



Uma rápida análise dedutiva pode facilitar o que queremos dizer. Machado de Assis, considerado o maior poeta brasileiro era mestiço, foi ele quem fundou a Academia Brasileira de Letras no Rio de Janeiro. Nesta mesma época foi apresentado a um catarinense, também conhecido por seus versos. Tratava-se de Luis Delfino, senador pelo Estado do Rio de Janeiro.
Ildefonso Juvenal, por conta da necessidade de criação de um espaço literário que abriga-se democraticamente brancos, negros e mulheres fundou o Centro Catarinense de Letras, em 1925. Dario de Bittencourt, sócio correspondente da agremiação catarinense ajudou na criação da Academia Riograndense de Letras em 1936, da qual seu confrade Ildefonso Juvenal foi nomeado sócio correspondente. E foi justamente nestas terras catarinenses que surgiu a maior expressão do gênero simbolista brasileiro, Cruz e Sousa. Esse influenciou toda uma geração de jovens negros e negras ao campo da literatura. Mas teria sido Cruz e Sousa o único negro de expressiva inteligência de sua época? Acreditamos que não! Como também não esteve sozinha em sua época a educadora e política Antonieta de Barros. Leonor de Barros também se notabilizava por sua atuação social na em meados da década de 20. Soma-se a este quadro os nomes de Trajano Margarida, João Rosa Júnior, Epaminondas Vicente de Carvalho, Eugênio Antônio de Carvalho e tantos outros espalhados por toda Santa Catarina e pelo Rio Grande do Sul.

A ampliação de nosso entendimento indica que estes sujeitos não são meros acidentes históricos. Não estavam isolados dos acontecimentos sociais, políticos ou econômicos nos estados do sul. É preciso compreender essas trajetórias em conjunto.

Veja o que nos diz Dario de Bittencourt no prefácio do livro “Contos de Natal” de Ildefonso Juvenal:
“Ildefonso Juvenal – o suavissimo autor destes suaves ‘Contos de Natal’ – é dos mais distintos autores da pujante ‘Nova Geração’ catarinense”. Mantendo comigo estreitas relações de amizade e de camaradagem literária e comércio espiritual, isso para mais de quinze anos, venho acompanhando, par a passo, a sua fúlgida ascensão no campo das letras, evocando aqui, quando de útil há ele feito, em prol de um mais intenso intercâmbio e de uma melhor aproximação entre os intelectuais de seu Estado e os do Paraná e do Rio Grande do Sul” (grifo nosso), (1939).

Dario de Bittencourt
No livro "Escritores do Rio Grande do Sul, cujo autor é Ari Martins, membro fundador da academia Rio-Grandense de Letras, consta a referência histórica mais completa de Dario de Bittencourt. Nascido em Porto Alegre, RS, no dia sete de fevereiro de 1901. Filho de Aurélio Veríssimo de Bittencourt Júnior e Maria da Glória Quilião de Bittencourt, formou-se em Direito em 1924. Dentre todas as suas atribuições foi diretor do jornal "O Exemplo", poeta e consultor jurídico da Associação Comercial de Varejistas. Pertenceu à Academia Rio-Grandense de Letras, 2º fase, de 1934-44.
Dario serviu também de inspiração para trabalhos de professores gaúchos. A professora Maria José Lanziotti Barreras, da Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul escreveu um livro que acompanha o escritor em duas vertentes da cultura gaúcha: o Castilhismo positivista e a Igreja Católica. Já o professor Helgio Trindade baseou-se em Dario para a sua tese de doutorado focando principalmente a militância da Ação Integralista Brasileira no Rio Grande do Sul.


Todo material pesquisado pelos professores foi doado pela família de Dario de Bittencourt para o acervo do núcleo de pesquisa da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Uma das fontes contatadas pelos professores foi Dario de Bittencourt Neto, que confirmou a longa pesquisa dos estudiosos para a construção das obras.
Na UFRGS são encontrados diversos documentos sobre Dario. Vão desde recortes de jornais sobre suas publicações, poemas, documentos jurídicos, até inúmeras correspondências. E em relação a essas correspondências, o fato interessante é que muitas delas expressam um pouco da cumplicidade de Dario para com seus amigos.


Ildefonso Juvenal da Silva
Nasceu em de 1884. De sua infância sabemos por intermédios de biógrafos que fora aprendiz de tipógrafo na Marinha do Brasil. Em 1914, aos vinte anos de idade lança seu primeiro livro de contos intitulado “páginas singelas” o qual, mereceu o apoio e os elogios de Delminda Silveira, escritora catarinense. Daí em diante não parou mais e de tudo um pouco escreveu e estudou ao longo de sua vida literária e intelectual. Acumulou vários títulos em associações literárias, nos institutos históricos e geográficos de Santa e Catarina e de São Paulo, escrevendo ora em prosa, contos, romances, fatos históricos, cuidados médicos, sobre a história da literatura catarinense.

Exerceu as funções de educador, militar, teatrólogo, farmacêutico, comerciante, jornalista e cronista. Contribuiu na fundação de associações negras, literárias e de classe. Esteve à frente do movimento de preservação da memória do poeta Cruz e Sousa, o qual, lançou a idéia de construir um busto em homenagem ao poeta negro. Paralelamente contribuiu na criação da primeira universidade federal no Estado do Paraná no ano de 1923, onde representou o governo de Santa Catarina. Destaca-se em suas ações, as defesas em prol da comunidade negra frente às manifestações de racismo presente na sociedade catarinense.

Entretanto, mesmo diante de avolumado material produzido em vida muito pouco encontra-se catalogado ou disponível aos pesquisadores e estudiosos. Sua obra está dispersa em empoeirados arquivos públicos os quais nem sempre recebem a necessária atenção dos administradores culturais.

Talvez, a maior contribuição no final de um trabalho de pesquisa como este é “descobrir que a presença negra não ficou à margem da sociedade da época” como alertaram alguns pesquisadores. E mais, notar que ao evidenciar duas personalidades encontramos muitas outras histórias e personagens negros, até então desconhecidos ou pouco conhecidos do grande público. Neste sentido, a história enquanto instrumento social cumpre sua finalidade cientifica, que é de guardar na memória fatos e acontecimentos relevantes à posteridade.


Saiba Mais:
BARRERAS, Maria José Lanziotti. Dario de Bittencourt: uma inclusão pela cultura política autoritária gaúcha. Porto Alegre: EDIPUCRS, 1998.

GARCIA, Fabio. Negras Pretensões: a presença de intelectuais, músicos e poetas negros nos jornais de Tijucas e Florianópolis no início do século XX. Florianópolis: ed. UMBUTU, 2007.

segunda-feira, 11 de agosto de 2008

Personalidades Negras Catarinenses III


Para quem gosta de música catarinense não pode deixar de conhecer o maestro João Rosa Júnior. Natural do município de Tijucas, nasceu em dois de dezembro de 1882. Estudou música no exército e no ano de 1912 já regia uma banda musical em Jaraguá do Sul. De grande talento musical compôs o dobrado "Dae a Cesar o que é de Cesar", ainda hoje tocado pela banda musical da Polícia Militar de SC. Sua carreira literária surgiu após estar complemente cego, João era portador do claucoma, mesmo assim, publicou três livros de poemas. João nos deixou cedo, em dez de outubro de 1932. Seus descendentes ainda preservam a memória deste grande catarinense que soube como ninguém lutar contra as adversidades da vida
Livros publicados:

Pleitos de homenagens (1924),
Através de tudo que é divino (1925) e
Extremos (1930).

Outras atividades: Maestro de diversas bandas militares em Santa Catarina e Rio Grande do Sul, na década de 1910; instrutor de músicas aos rapazes do comercio de Florianópolis; membro do Centro Catarinense de Letras no ano de 1925 e; membro do Centro Cívico e Recreativo Cruz e Souza de Florianópolis em 1927.